sábado, outubro 31, 2009
O Primo Basílio
…
Nunca achara Basílio tão bonito; o quarto mesmo parecia-lhe muito conchegado para aquelas intimidades da paixão: quase julgava possível viver ali, naquele cacifro, anos, feliz com ele, num amor permanente, e lunchs às três horas… Tinham as pieguices clássicas: metiam-se bocadinhos na boca: ela ria com os seus dentinhos brancos: bebiam pelo mesmo copo, devoravam-se de beijos – e ele quis-lhe ensinar então a verdadeira maneira de beber champanhe. Talvez ela não soubesse!
- Como é? – perguntou Luísa erguendo o copo.
- Não é com o copo! Horror! Ninguém que se preze bebe champanhe por um copo. O copo é bom para o Colares…
Tomou um gole de champanhe, e num beijo passou-o para a boca dela. Luísa riu muito, achou «divino», quis beber mais assim. Ia-se fazendo vermelha, o olhar luzia-lhe.
Tinham tirado os pratos da cama; e sentada à beira do leito, os pezinhos calçados numa meia cor-de-rosa pendiam, agitavam-se, enquanto um pouco dobrada sobre si, os cotovelos sobre o regaço, a cabecinha de lado, tinha em toda a sua pessoa a graça lânguida de uma pomba fatigada.
Basílio achava-a irresistível: quem diria que uma burguesinha podia ter tanto chique, tanta queda? Ajoelhou-se, tomou-lhe os pezinhos entre as mãos, beijou-lhos; depois, dizendo muito mal das ligas «tão feias, com fechos de metal», beijou-lhe respeitosamente os joelhos; e então fez-lhe baixinho um pedido. Ela corou, sorriu, dizia: - Não! Não! – E quando saiu do seu delírio tapou o rosto com as mãos, toda escarlate, murmurou repreensivamente.
- Oh, Basílio!
Ele torcia o bigode, muito satisfeito. Ensinara-lhe uma sensação nova: tinha-a na mão!
Só às seis horas se desprendeu dos seus braços. Luísa fez-lhe jurar que havia de pensar nela toda a noite: - não queria que ele saísse; tinha ciúmes do Grémio, do ar, de tudo! – E já no patamar voltava, beijava-o, louca, repetia:
- E amanhã mais cedo, sim?, para estarmos todo o dia.
- Não vais ver a D. Felicidade?
- Que me importa a D. Felicidade! Não me importa ninguém! Quero-te a ti! Só a ti!
- Ao meio-dia?
- Ao meio-dia!
…
in “O Primo Basílio” – Eça de Queirós
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
11 comentários:
tás a gostar?:)
Quase, quase a acabar.
Muito bom! :)
li este livro tinha 15/16 anos e ainda hoje me recordo destes encontros! :)*
Os encontros no Paraíso... :)*
:D
Acho que Eça tinha essa capacidade, de escrever para todos os tempos.
Jorge (se não estou a confundir), o sensato, Basílio, o egocêntrico. A segurança e a aventura. As diferenças sociais, a inveja, a futilidade,......
Já não me lembro de tudo, mas Basílio era uma rica peça!
Bjks
Sim, sem dúvida. Os anos vão passando mas parece que nós, os portugueses, nos vamos mantendo sempre iguais, com os mesmo defeitos e as mesmas virtudes.
É verdade, o Basílio era um malandro... ;)*
lol... Já dizia Almada Negreiros "A grandeza de um povo mede-se pela sua história e pelas suas virtudes! Coragem portugueses, já só faltam as virtudes" (",)
Abraço
Humm... quer me parecer que ainda vai ser precisa muita coragem... :D
Abraço
E A Relíquia, já leste? Uma delícia...
Não. O próximo que ler do Eça vai ser esse :)*
Enviar um comentário