sábado, março 24, 2007

Soneto de amor


Andrew Lipcko - Morning

Não me peças palavras, nem baladas,

Nem expressões, nem alma...Abre-me o seio,

Deixa cair as pálpebras pesadas,

E entre os seios me apertes sem receio.


Na tua boca sob a minha, ao meio,

Nossas línguas se busquem, desvairadas...

E que os meus flancos nus vibrem no enleio

Das tuas pernas ágeis e delgadas.


E em duas bocas uma língua..., - unidos,

Nós trocaremos beijos e gemidos,

Sentindo o nosso sangue misturar-se.


Depois... - abre os teus olhos, minha amada!

Enterra-os bem nos meus; não digas nada...

Deixa a Vida exprimir-se sem disfarce!


José Régio - Soneto de amor



sábado, março 17, 2007

Preciso de palavras, de amor


Gustav Klimt - The kiss

Preciso de palavras, de amor. Tuas. Para mim. Palavras que sentem. Olhos que procuram. Os meus. Palavras onde transparece o desejo a corpos despidos. A metamorfose no uno. Palavras que confessam. Mãos frias. As tuas. Sem as minhas. Palavras que contam. Já não vou aos croissants quentes na Foz. Sem ti deixaram de ser doces e fofos. Palavras que relembram. Serralves. O perfume do jardim das aromáticas. Dois enlaçados num só corpo. O primeiro beijo, no banco de madeira junto ao lago. Olhos cerrados. Os meus. Um sorriso. Teu. Queria guardar para sempre o sabor dos teus lábios. Palavras tristes. Saudade. Os poemas que sussurrei ao teu ouvido. O nosso olhar cúmplice, de mãos dadas debaixo da mesa. A poesia num rosto. O teu. Um riso sereno. Meu. Preciso de palavras, de amor. Tuas. Para mim.

JFDourado - Preciso de palavras, de amor – 17/03/2007


terça-feira, março 06, 2007

Vertentes


Uriy Kakichev - The Sun in the Grass

As palavras esperam o sono

e a música do sangue sobre as pedras corre

a primeira treva surge

o primeiro não a primeira quebra


A terra em teus braços é grande

o teu centro desenvolve-se como um ouvido

a noite cresce uma estrela vive

uma respiração na sombra o calor das árvores


Há um olhar que entra pelas paredes da terra

sem lâmpadas cresce esta luz de sombra

começo a entender o silêncio sem tempo

a torre estática que se alarga


A plenitude animal é o interior de uma boca

um grande orvalho puro como um olhar

Deslizo no teu dorso sou a mão do teu seio

sou o teu lábio e a coxa da tua coxa

sou nos teus dedos toda a redondez do meu corpo

sou a sombra que conhece a luz que a submerge


a luz que sobe entre

as gargantas agrestes

deste cair na treva

abre as vertentes onde

a água cai sem tempo


António Ramos Rosa – Vertentes