sábado, maio 09, 2009

A lâmpada de Aladino


Gypsy - kees van Dongen


Nessa noite o Turco montou a sua tenda à entrada de um bosque de coihues e araucárias. O ar cheirava a madeira e a mar. Fumando o seu cachimbo fez um inventário dos seus bens, disse para consigo que o dia não tinha sido mau e meteu-se debaixo da grossa manta castelhana, disposto a dormir em paz.
Preparava-se para apagar com um sopro o candeeiro de latão quando a mulher Kawésqar irrompeu na tenda.
- Laáks – disse em jeito de cumprimento, apontando para a manta escura e espessa que o cobria.
- Não, não laáks, não está à venda – respondeu o Turco. A Kawésqar olhou-o nos olhos, sorriu ao ver que neles se reflectia duas vezes a pequena chama da lâmpada e, com um movimento enérgico, tirou a túnica de pele que lhe cobria o corpo esbelto de navegante e caçadora. Era uma mulher Kawésqar, a origem do fogo que consome os homens.
O Turco observou aquele corpo esbelto, as coxas firmes, as ancas suportadas pela mais forte mastreação, o ventre plano e os seios destinados a amamentar os melhores filhos do mar.
Durante horas amou-a entre gemidos, embates e derrotas. Em cima dela sentiu-se a bordo do navio mais seguro e ela, montada nele, era a mais graciosa das amazonas.
Ao amanhecer, o Turco levou uma mão ao peito e disse que se chamava Aladino. Vamos lá ver, diz o meu nome, Aladino, pediu-lhe, mas a Kawésqar respondeu com palavras, sons duros como os recifes da ilha Wellington.
Laáks? – perguntou a mulher abraçada à manta castelhana.
- Sim, laáks, é tua – respondeu, acariciando o cabelo negro da mulher que caía até às nádegas e se unia à escuridão da manta.
A mulher apontou para si própria, com um dedo entre os seios.
- Sim, laáks de Aladino agora é tua, agora é laáks de como quer que te chames.
A Kawésqar estava de joelhos, acariciava a manta, levava-a até à cara e sorria satisfeita. A chama fraca da lâmpada banhava-lhe o corpo de mel. O Turco viu-a levantar-se, cobrir-se novamente com a túnica de peles de guanaco, fazer um rolo com a manta castelhana até os seus olhos pousarem na lâmpada.
- Também é tua, é justo. Chama-se lâmpada e funciona assim, anda cá para te ensinar, aqui pões gordura ou óleo, deixas que a mecha saia pelo bico e acendes. Toma, é tua.
- Lâmpada de Aladino – ciciou a mulher Kawésqar, agarrando-a como se fosse o mais delicado dos objectos.
- Sim, é a lâmpada de Aladino – confirmou o Turco, e saiu da tenda para encher os pulmões do ar perfumado dos bosques e dos mares austrais.


in “A lâmpada de Aladino” – Luis Sepúlveda


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