sexta-feira, março 26, 2010
Todo o espaço é um rosto puro
Aproa o barco na sua linha de azimute. O vestido alvescente surgirá na praia. Reluzindo. Ondulando ao vento como bandeira que assinala o destino. Ela, de braços estendidos ao longo do corpo. Mãos pelo regaço. Enlaçadas. Ansiosas. Olhar fixo no fio do horizonte. Ciciando o seu nome como uma prece. Serenando as águas. Esperando-o… E navega o tempo fantasiando regressos. Sonhando-a. Profundos poentes de tardes douradas no seu olhar. O mar como se viesse num esmerado beijo, envolvendo-lhe languidamente os pés nus. Rodeada de búzios, estrelas-do-mar e pios de gaivotas livres planando a fresca maresia. Ao largo, na solidão do barco, todo o espaço é um rosto puro. Todo o espaço é um desenho com o traço fino e delicado das memórias dos dias que virão.
Todo o espaço é um rosto puro – Jorge Dourado
domingo, março 21, 2010
Variações em tom menor
Para jardim te queria.
Te queria para gume
ou o frio das espadas.
Te queria para lume.
Para orvalho te queria
sobre as horas transtornadas.
Para a boca te queria.
Te queria para entrar
e partir pela cintura.
Para barco te queria.
Te queria para ser
canção breve, chama pura.
Variações em tom menor - Eugénio de Andrade
sábado, março 13, 2010
Este lago não existe
…
No pelouro das madrugadas entrego parte da minha ausência. Os percursos vários por onde só sonhos naveguem, por onde só passos leves consigam interiorizar as trevas destas areias escondidas, no raro real de mim, no confuso e díspar silêncio destas horas aqui descritas, devorando com ansiedade as maresias deste lago, onde flutuam os sorrisos dos tempos que me esperam, que busco, os sorrisos a que me dou, levando-me consigo, enriquecendo os membros de todo eu, perfilando-me por estas florestas irreais, por entre as folhagens da vida aqui, as fantasias quase sempre enormes.
…
in “Este lago não existe” – Vítor Burity da Silva
domingo, março 07, 2010
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