sábado, julho 17, 2010
Memórias das minhas putas tristes
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Nos meus doze anos, ainda de calças curtas e botinhas da escola primária, não pude resistir à tentação de conhecer os andares superiores enquanto o meu pai se debatia numa das suas reuniões intermináveis, e deparei com um espectáculo celestial. As mulheres que malvendiam os seus corpos até ao amanhecer moviam-se pela casa desde as onze da manhã, quando já a canícula do vitral era insuportável, e tinham que fazer a sua vida doméstica andando em pelota por toda a casa enquanto comentavam aos gritos as suas aventuras da noite. Fiquei aterrorizado. A única coisa que me ocorreu foi escapar por onde tinha vindo, quando uma das despidas de carnes maciças cheirando a sabão barato me abraçou pelas costas e me levou pelo ar até ao seu cubículo de cartão sem que eu a pudesse ver no meio da gritaria e dos aplausos das inquilinas em pêlo. Atirou-me de barriga para cima na sua cama para quatro, tirou-me as calças com uma manobra de mestre e encavalitou-se em cima de mim, mas o terror gelado que me ensopava o corpo impediu-me de a receber como um homem. Naquela noite, acordado na cama da minha casa pela vergonha do assalto, não consegui dormir mais de uma hora com as ânsias de a voltar a ver. Mas na manhã seguinte, enquanto os noctívagos dormiam, subi a tremer até ao seu cubículo e acordei-a a chorar aos gritos, com um amor enlouquecido que durou até que o levou sem piedade a ventania da vida real. Chamava-se Castorina e era a rainha da casa.
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in “Memórias das minhas putas tristes” – Gabriel García Márquez - páginas 109 e 110
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