quinta-feira, maio 06, 2010

O riso de Deus


O sonho de José - Beatriz Milhazes


A Ulla foi minha guia, companheira e amada durante aqueles dias que passei em Estocolmo. Como disse, tinha um corpo sem culpas e acho que andava à procura de um latino. Só vi o que lhe faltava naquele dia em que combinámos um passeio de ferryboat e ficamos de nos encontrar no cais, às nove horas da manhã. As nuvens faziam o tecto do dia, como acontece por lá. Quando cheguei ela disse-me:
«Que pena, hoje não há sol…» Eu olhei para ela, dos pés aos olhos e respondi a sorrir: «Não. Eu tenho sol…» Ela ficou emocionada e gaguejou ao falar: «Mas, tu és um poeta!...»
Eu não era nenhum poeta. Eles, por lá, é que não sabiam dizer uns aos outros que eram o sol de cada um.


in “O riso de Deus” – António Alçada Baptista - pag. 95